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domingo, 31 de maio de 2015

A mcdonaldização da escola -GENTILI, Pablo; ALENCAR, Francisco.



A mcdonaldização da escola

Este foi o nome atribuído por Pablo Gentili ao processo de transferência  dos princípios que regulam a lógica de funcionamento dos fast foods a espaços institucionais cada vez mais amplos na vida social do capitalismo contemporâneo. Traduz-se numa metáfora que representa a lógica das administrações neoliberais.
Na concepção neoliberal, as instituições escolares devem funcionar como empresas produtoras de serviços educacionais. A interferência estatal não pode questionar o direito de livre escolha que os consumidores de educação devem realizar no mercado escolar. Por isso a rede Mc Donald.s representa um bom modelo organizacional para a modernização escolar. Gentili diz que na visão real, mas não publicizada dos neoliberais, tanto os fast foods como a escola existem para dar conta de duas necessidades fundamentais: comer e ser socializado. E continua: o que unifica o Mc Donald.s e a utopia educacional dos homens de negócios é que, em ambos, a mercadoria oferecida deve ser produzida de forma rápida e de acordo com certas e rigorosas normas de controle da eficiência e produtividade. Se o  sistema escolar tem que se configurar como mercado educacional, as escolas devem então definir estratégias competitivas para atuar em tais mercados conquistando a diversidade existente nas demandas de consumo por educação. Poderíamos ainda questionar porque o mercado educacional precisa ser competitivo. A isso Gentili responderia que assim como as pessoas precisam comer hambúrgueres porque o trabalho o exige, também precisam educar-se porque o conhecimento se transformou na chave de acesso à nova sociedade do saber.
A necessidade de permitir a competição entre as instituições explica a ênfase em mecanismos de desregulamentação, flexibilização da oferta e livre escolha dos consumidores na esfera educacional. E a possibilidade de construção de um mercado escolar competitivo depende da difusão de rigorosos critérios de regulação interna que conduzam o cotidiano da escola, de modo semelhante ao que ocorre nos  fast foods,cuja lógica é a de quem mais produz, mais ganha.
Para Gentili, o processo de mcdonaldização da escola também tem seu efeito no currículo e na formação de professores através do que ele chama de planejamento de cardápios e estratégias neo tecnicistas. Em outras palavras, as políticas de formação docente vão se configurando como pacotes fechados de treinamento planejados de forma centralizada sem participação dos professores. A pedagogia fast food – sistemas de treinamento rápido com poder disciplinador e altamente centralizado em seu planejamento e aplicação - também seria um sintoma dessa nova forma de olhar e gerenciar a escola. Decorre disso que, na visão neoliberal, formar um professor não costuma ser considerada uma tarefa mais complexa do que a de treinar um preparador de hambúrgueres. Em relação ao ideal de progressiva universalização da escola pública, Gentili argumenta que poderíamos suspeitar que os Mc Donald.s tivessem melhor futuro que a escola pública, uma vez que reforma escolar na visão neoliberal se reduz a uma série de critérios empresariais de caráter alienante e excludente. Para encontrar possíveis saídas para essa crise, os neoliberais acreditam que os homens de negócios devem ser consultados.
Gentili finalmente alerta que é nesse contexto que deve ser compreendida a atitude mendicante e cínica dos governantes que solicitam aos empresários que, por exemplo, adotem uma escola; nessas circunstâncias, os padrinhos doariam recursos financeiros e princípios morais baseados na qualidade total e no esforço individual. Entretanto, os neoliberais reconhecem que a crise na educação envolve um conjunto de problemas técnicos e pedagógicos desconhecidos pelos empresários. Assim, sair da crise pressupõe consultar especialistas e técnicos competentes que seriam os peritos em currículo, em formação de professores a distância, especialistas em tomadas de decisão com escassos recursos, sabichões reformadores do Estado, intelectuais competentes em redução de gastos públicos e doutores em eficiência e produtividade; todos retirados de organismos internacionais.

GENTILI, Pablo; ALENCAR, Francisco. Educar para a esperança em tempo de desencanto. Petrópolis: Vozes, 2001

sexta-feira, 15 de maio de 2015

A forma escolar de tortura- Por Rubem Alves



Eu fui vítima dele. Por causa dele odiei a escola. Nas minhas caminhadas passadas eu o via diariamente. Naquela adolescente gorda de rosto inexpressivo que caminhava olhando para o chão. E naquela outra, magricela, sem seios, desengonçada, que ia sozinha para a escola. Havia grupos de meninos e meninas que iam alegremente, tagarelando, se exibindo, pelo mesmo caminho... Mas eles não convidavam nem a gorda e nem a magricela. Dediquei-me a escrever sobre os sofrimentos a que as crianças e adolescentes são submetidos em virtude dos absurdos das práticas escolares. Mas nunca pensei sobre os sofrimentos que colegas infligem a colegas seus. Talvez eu preferisse ficar na ilusão de que todas as crianças e todos os adolescentes são vítimas. Não são. Crianças e adolescentes podem ser cruéis.

“Bullying” é o nome dele. Fica o nome inglês porque não se encontrou palavra em nossa língua que seja capaz de dizer o que “bullying” diz. “Bully” é o valentão: um menino que, e em virtude de sua força e de sua alma deformada pelo sadismo tem prazer em intimidar e bater nos mais fracos. Vez por outra as crianças e adolescentes brigam em virtude de desentendimentos. São brigas que têm uma razão. Acidentes. Acontecem e pronto. Não é possível fazer uma sociologia dessas brigas. Depois da briga os briguentos podem fazer as pazes e se tornarem amigos de novo. Isso nada têm a ver com o “bullying”. No “bullying” um indivíduo, o valentão, ou um grupo de indivíduos, escolhe a sua vítima que vai ser o seu “saco de pancadas”. A razão? Nenhuma. Sadismo. Eles “não vão com a cara” da vítima. É preciso que a vítima seja fraca, que não saiba se defender. Se ela fosse forte e soubesse se defender a brincadeira não teria graça. A vítima é uma peteca: cada um bate e ela vai de um lado para outro sem reagir. Do “bulling” pode-se fazer uma sociologia porque envolve muitas pessoas e tem continuidade no tempo. A cada novo dia, ao se preparar para a escola, a vítima sabe o que a aguarda. Até agora tenho usado o artigo masculino – mas o “bullying” não é monopólio dos meninos. As meninas usam outros tipos de força que não a força dos punhos. E o terrível é que a vítima sabe que não há jeito de fugir. Ela não conta aos pais, por vergonha e medo. Não conta aos professores porque sabe que isso só poderá tornar a violência dos colegas mais violenta ainda. Ela está condenada à solidão. E ao medo acrescenta-se o ódio. A vítima sonha com vingança. Deseja que seus algozes morram. Vez por outra ela toma providências para ver seu sonho realizado. As armas podem torná-la forte.

Freqüentemente, entretanto, o “bullying” não se manifesta por meio de agressão física, mas por meio de agressão verbal e atitudes. Isolamento, caçoada, apelidos.

Aprendemos dos animais. Um ratinho preso numa gaiola aprende logo. Uma alavanca lhe dá comida. Outra alavanca produz choques. Depois de dois choques o ratinho não mais tocará a alavanca que produz choques. Mas tocará a alavanca da comida sempre que tiver fome. As experiências de dor produzem afastamento. O ratinho continuará a não tocar a alavanca que produz choque ainda que os psicólogos que fazem o experimento tenham desligado o choque e tenham ligado a alavanca à comida. Experiências de dor bloqueiam o desejo de explorar. O fato é que o mundo do ratinho ficou ordenado. Ele sabe o que fazer. Imaginem agora que uns psicólogos sádicos resolvam submeter o ratinho a uma experiência de horror: ele levará choques em lugares e momentos imprevistos ainda que não toque nada. O ratinho está perdido. Ele não tem formas de organizar o seu mundo. Não há nada que ele possa fazer. Os seus desejos, eu imagino, seriam dois. Primeiro: destruir a gaiola, se pudesse, e fugir. Isso não sendo possível, ele optaria pelo suicídio.

Edimar era um jovem tímido de 18 anos que vivia na cidade de Taiúva, no estado de São Paulo. Seus colegas fizeram-no motivo de chacota porque ele era muito gordo. Puseram-lhe os apelidos de “gordo”, “mongolóide”, “elefante-cor-de-rosa” e “vinagrão”, por tomar vinagre de maçã todos os dias, no seu esforço para emagrecer. No dia 27 de janeiro de 2003 ele entrou na escola armado e atirou contra seis alunos, uma professora e o zelador, matando-se a seguir.

Luis Antônio, garoto de 11 anos. Mudando-se de Natal para Recife por causa do seu sotaque passou a ser objeto da violência de colegas. Batiam-lhe, empurravam-no, davam-lhe murros e chutes. Na manhã do dia fatídico, antes do início das aulas, apanhou de alguns meninos que o ameaçaram com a “hora da saída”. Por volta das dez e meia, saiu correndo da escola e nunca mais foi visto. Um corpo com características semelhantes ao dele, em estado de putrefação, foi conduzido ao IML para perícia.

Achei que seria próprio falar sobre o “bullying” na seqüência do meu artigo sobre o tato que se iniciou com esta afirmação: O tato é o sentido que marca, no corpo, a divisa entre Eros e Tânatos. É através do tato que o amor se realiza. É no lugar do tato que a tortura acontece. “Bullying” é a forma escolar da tortura.

FONTE:http://www.rubemalves.com.br/aformaescolardatortura.htm

A ESCOLA DOS BICHOS - Rosana Rizzuti



Conta-se que vários bichos decidiram fundar uma escola. Para isso reuniram-se e começaram a escolher as disciplinas.
O Pássaro insistiu para que houvesse aulas de vôo. O Esquilo achou que a subida perpendicular em árvores era fundamental. E o Coelho queria de qualquer jeito que a corrida fosse incluída.E assim foi feito, incluíram tudo, mas...cometeram um grande erro. Insistiram para que todos os bichos praticassem todos os cursos oferecidos.O Coelho foi magnífico na corrida, ninguém corria como ele. Mas queriam ensiná-lo a voar.
Colocaram-no numa árvore e disseram: "Voa,Coelho". Ele saltou lá de cima e "pluft"...coitadinho! Quebrou as pernas. O Coelho não aprendeu a voar e acabou sem poder correr também.O Pássaro voava como nenhum outro, mas o obrigaram a cavar buracos como uma topeira.Quebrou o bico e as asas, e depois não conseguia voar tão bem, e nem mais cavar buracos.

SABE DE UMA COISA?
Todos nós somos diferentes uns dos outros e cada um tem uma ou mais qualidades próprias dadas por DEUS. Não podemos exigir ou forçar para que as
outras pessoas sejam parecidas conosco ou tenham nossas qualidades.Se assim agirmos, acabaremos fazendo com que elas sofram, e no final, elas poderão não ser o que queríamos que fossem e ainda pior, elas poderão não mais fazer o que faziam bem feito.

RESPEITAR AS DIFERENÇAS É AMAR AS PESSOAS COMO ELAS SÃO


Ver Vendo - Otto Lara Rezende



De tanto ver, a gente banaliza o olhar – ver... não vendo.
Experimente ver, pela primeira vez, o que você vê todo dia, sem ver.
Parece fácil, mas não é: o que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade.
O campo visual da nossa retina é como o vazio.
Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta.
Se alguém lhe pergunta o que você vê pelo caminho, você não sabe.
De tanto vê, você banaliza o olhar.
Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo hall do prédio do seu escritório.
Lá estava sempre, pontualíssimo, o porteiro.
Dava-lhe bom dia, às vezes, lhe passava um recado ou uma correspondência.
Um dia o porteiro faleceu.
Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a mínima idéia.
Em 32 anos nunca consegui vê-lo.
Para ser notado o porteiro teve que morrer.
Se, um dia, em seu lugar tivesse uma girafa cumprindo o rito, pode ser, também, que ninguém desse por sua ausência.
O hábito suja os olhos e baixa a vontade. Mas a sempre o que ver; gente; coisa; bichos.
E vemos? Não, não vemos.
Uma criança vê aquilo que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpo para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez, o que, de tão visto, ninguém vê. O pai que raramente vê o próprio filho. O marido que nunca viu a própria mulher.
Os nossos olhos se gastam no dia a dia, opacos.
...e por ai que se instala no coração o monstro da indiferença


sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Rubem Alves - Texto "Saco de Brinquedos"


...Eu quis transcrever esse texto, hoje, porque talvez você entenda, de uma vez por todas, que embora cresçamos, continuamos querendo brincar, como crianças.
Você admira o outro, em última análise, por imaginar o tanto de brincadeira que pode estar guardada dentro dele, pra vocês brincarem juntos; e se depois de conhecer o saco de brinquedos que ele traz você ainda não se cansa, e continua ficando feliz só de pensar em brincar com ele, e o mesmo se dá entre ele e você... vocês têm tudo para ser felizes de verdade!
 
 
Meu pai me contou que, quando era menino, no início do século passado, guardava seus brinquedos num saco. Os brinquedos que meu pai menino guardava no saco: latas vazias, pedaços de barbante, sementes, sabugos de milho, botões, pedaços de pau, pedrinhas e todo tipo de coisas inúteis. Quando alguém aparecia para visitar minha avó ele pegava o saco de brinquedos e o esvaziava diante da visita. Certamente achava seus brinquedos interessantíssimos! A mãe dele ficava furiosa e lhe aplicava o devido corretivo de chineladas depois que a visita ia embora. A chinela era um dos itens favoritos que minha avó guardava no saco de brinquedos dela. As crianças continuam as mesmas. Ainda gostam de mostrar brinquedos. A gente cresce e continua criança. "Em todo homem há uma criança que deseja brincar..." (Nietzsche). E todos temos o nosso saco de brinquedos. A fala somos nós abrindo o saco e despejando brinquedos... O saco de brinquedos..
 

http://blogdasuzi.blogspot.com.br/2009/10/um-texto-de-rubem-alves-sobre-crianca.html